Texto de autoria: Paulo Henrique Stahlberg Natal
Data: 30/09/2020.
Tema bastante controvertido nos Tribunais Brasileiros é aquele relativo à aplicabilidade das Convenções e Tratados Internacionais sobre transporte aéreo, quando conflitarem com o direito nacional.
A controvérsia se alongou por anos, tendo chegado à Suprema Corte, cuja decisão fixada fora tomada em plenário, no ano de 2017.
No julgamento do Recurso Extraordinário 636.331, fora fixada a seguinte tese: “Nos termos do art. 178 da Constituição da República, as normas e os tratados internacionais limitadores da responsabilidade das transportadoras aéreas de passageiros, especialmente as Convenções de Varsóvia e Montreal, têm prevalência em relação ao Código de Defesa do Consumidor.” (registrado sob Tema n.º 210)
Ocorre que, recentemente (em maio de 2020) o Ministro Luiz Fux afastou a aplicabilidade da referida tese 210, firmada no âmbito do RE 636.331, em caso de serviço aéreo de cargas, concluindo pela inaplicabilidade da indenização limitada prevista nas Convenções de Varsóvia e Montreal. Para tanto, o Ministro utilizou o seguinte argumento:” Impende destacar, ainda, a existência de distinção entre o caso sub examine, que versa sobre danos decorrentes de falha na prestação de serviço de transporte aéreo de cargas e o consequente direito de regresso decorrente de contrato de seguro, e o leading case objeto do Tema 210 da Repercussão Geral (RE 636.331, Rel. Min. Gilmar Mendes), em que controvertida a limitação da responsabilidade de transportadoras áreas de passageiros por extravio de bagagens em voos internacionais, não se aplicando à espécie, por conseguinte, a tese firmada no referido precedente." RE 1242964 AGR / SP.
Diante da decisão exarada pelo i. Ministro, houve de sua parte, o reconhecimento de que o caso envolvendo os danos decorrentes de falha no transporte aéreo de cargas, não se amolda àquela tese firmada no julgamento do RE 636.331, que por sua vez reflete o posicionamento firmado acerca da prevalência dos tratados sobre a lei ordinária doméstica apenas para fins de limitação da responsabilidade das transportadoras aéreas de passageiros.
Como se observa, então, a questão que deveria ter sido pacificada no julgamento do Recurso Extraordinário 636.331, Rel. Ministro Gilmar Mendes, acabou ficando aquém da expectativa dos setores envolvidos. Ao que tudo indica, novas discussões e disputas jurídicas surgirão em razão da limitação da discussão posta naquele caso concreto (danos por extravio de bagagem e atraso de voo em transporte internacional de passageiros) e devido à própria redação da tese firmada no âmbito da Suprema Corte.
Em nosso entender, parece correta do ponto vista da técnica processual a decisão do Ministro Luiz Fux, pois, a rigor, o caso submetido a julgamento (danos decorrentes do transporte aéreo internacional de cargas) não estaria subsumido nos limites da tese fixada no recurso extraordinário n.º 636.331, que versou a respeito da limitação da responsabilidade de transportadoras áreas de passageiros por extravio de bagagens em voos internacionais.
De outro lado, contudo, pela leitura dos fundamentos dos votos proferidos pelos eminentes Ministros daquela Suprema Corte, a interpretação por nós alcançada é no sentido de que prevalecem as normas dos Tratados e Convenções Internacionais em matéria de ordenação do transporte aéreo quando conflitarem com a lei ordinária doméstica, seja a respeito do transporte de passageiros e suas bagagens, seja no que tange ao transporte internacional de cargas, posto que tal sobreposição decorre do disposto no artigo 178 da Constituição Federal, que por sua vez não faz distinção entre as modalidades.
Artigo 178: A lei disporá sobre a ordenação dos transportes aéreo, aquático e terrestre, devendo, quanto à ordenação do transporte internacional, observar os acordos firmados pela União, atendido o princípio da reciprocidade. (Redação dada pela Emenda Constitucional nº 7, de 1995)-------------------------------------------------------
Texto de Autoria: Paulo Henrique Stahlberg Natal
Data: 30/09/2020.